segunda-feira, 6 de setembro de 2010

UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA

“É preciso entender e aceitar que o ponteiro de minutos trabalhando, na aparência, sessenta vezes menos, colha os mesmos frutos e chegue aos mesmos resultados do ponteiro de segundos”.

Citação de Dom Helder Câmara no livro Meditações do Padre José, de 1980.
Homem de diálogo eloquente pautou sua vida em uma trajetória caracterizada pela postura serena, ágil, corajosa na luta pelos menos favorecidos em especial os jovens.
Segundo o escritor Ênio Silveira, “credita-se ao autor o fato de que a justiça e a paz são estabelecidas ao fim de tortuoso caminho, de longas marchas e contramarchas em que os homens se irão depurando dos ódios, das vaidades e dos preconceitos”.
Analisando os ponteiros a que se refere Câmara, um trabalha mais do que o outro, mesmo que obtendo o mesmo desempenho.
Por outro lado, o ponteiro que não precisou se esforçar sobremaneira, para produzir com a mesma eficácia pressupõe o quanto estava mais adequadamente preparado.
E a vida segue, como um relógio! Uns trabalham mais e produzem, outros trabalham menos, mas também produzem, alguns atrasam, outros estragam e há aqueles que param simplesmente.
No Brasil, ficou famosa a Lei de Gerson -- lei de artigo único, uma bonança para se levar vantagem em tudo. Mesmo num país em que há muitas leis, dentre as quais, poucas são cumpridas, a Lei de Gerson está a desfilar de braços dados com muita gente país afora, desafiando o tempo; quanto mais velha, melhor e mais adotada, consequentemente praticada rotineiramente.
É cumprida ao “pé da letra”.
Sua versão final ficou assim: “tire proveito de tudo o que puder, pense somente em você mesmo e esqueça o resto”.
Sarcasticamente, é muito praticada no país.
Pode parecer surreal, mas esta lei pode até provocar incredulidade no leitor, pois há inúmeros eventos que a evocam nas mais diversas pautas, mas acredite, é real!
E não é por menos que os mesmos personagens que festejaram a realização dos Jogos Pan-Americanos no Rio em 2007 estão eufóricos com a realização da Copa de 2014.
Como os ponteiros do relógio do poema ou sob a mancha do aríete ou tuteladas pela Lei de Gerson, em algumas ações, o governo trabalha rápido. Se, preciso for, cria medidas provisórias, fura fila no BNDES para agilizar financiamentos, elabora pacotes de benefícios, com a perspicácia de transformar tudo isso num grande evento político.
Buscar uma razão plausível para o descaso com a educação, é a mais corriqueira das sínteses. Como um relógio velho, está jogada num canto qualquer. Seria medo?
Segundo Rubem Alves, “o medo não é uma perturbação psicológica. Ele é parte da nossa própria alma. O que é decisivo é se o medo nos faz rastejar ou se ele nos faz voar. Quem, por causa do medo, se encolhe e rasteja, vive a morte na própria vida”.
Moribundos na mesma Unidade de Terapia Intensiva encontram-se, a Educação, o Respeito, a Transparência – essa então, internada já faz tempo, a Ética, a Vergonha, entre outros. Estão todos lá, pouco visitados! Recentemente chegou uma outra paciente terminal. Por ordem médica, não poderá ter seu nome divulgado, para não criar muito constrangimento. Suspeita-se que seja a Verdade.
Para alegrar o povo e muito mais quem a organiza, vem aí mais uma Copa. E será no Brasil!
Até 2014 não se falará de outra coisa. O restante torna-se de pouca importância. Digo pouca, por ser otimista! Resta saber se os pacientes sobreviverão por tanto tempo.
Os relógios já registram a contagem regressiva para o seu início, que de fato, já começou pelo menos na falação das autoridades. E só!
O que não começou até agora é a ação que se aguarda corajosa dos governantes de tocarem no cerne de uma questão relacionada à soberania nacional: a melhoria radical da qualidade da educação no Brasil!
Mas isso passa muito longe das Copas, não é mesmo?

Paulo Celso Magalhães

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